sábado, 5 de março de 2011

Manoel Barros

"Chamaram-me de imbecil, não aguentei e chorei, sou muito fraco para elogios." 





 Um monge descabelado me disse no caminho: “Eu queria construir uma ruína.

Embora eu saiba que ruínas é uma desconstrução.

Minha idéia era de fazer alguma coisa ao jeito de tapera. Alguma coisa que servisse para

abrigar o abandono

, como as taperas abrigam. Porque o abandono pode não ser apenas de um homem debaixo da ponte, mas pode ser também de um gato no beco ou de uma

criança presa num cubículo

O abandono pode ser também de uma expressão que tenha entrado para o arcaico ou mesmo de uma palavra. Uma palavra que esteja sem ninguém dentro. (O olho do monge estava perto de ser um canto.) Continuou: digamos a palavra AMOR.

A palavra amor está quase vazia. Não tem gente dentro dela.

Queria construir uma ruína para salvar a palavra amor. Talvez ela renascesse das ruínas; como um lírio pode nascer de um monturo.” E o monge se calou descabelado.



(Manoel de Barros)